quarta-feira, 14 de março de 2012

IRACEMA JOSÉ DE ALENCAR

IRACEMA JOSE DE ALENCAR
Por Francisca Clotilde

Num blandicioso estilo comparável ao canto do sabiá, na espessura da mata, em alvorecer primaveril, José de Alencar, glória da Terra cearense, idealizou o tipo gracioso dessa índia em cujo coração se acrisolavam os sentimentos fortes de uma raça selvagem e a meiguice empolgante de uma alma de donzela aprimorada ao sopro da civilização.

Livre como a corsa, ela palmilhava os sertões e mirava o rosto moreno, de traços corretos, na limpidez das águas da lagoa, cristalizadas aos esplendores do sol.

Desprendiam festivos cantares quando a aurora roseava o céu e as flores silvestres que desatavam as pétalas embalsamando os campos do Ipu, ornava-lhe os cabelos opulentos e negros.

Os guerreiros mais famosos encontravam-na esquiva e ao fitarem a luz de seus olhos e o frescor de seus lábios rubros entreabrindo sorrisos álacres, pensavam que IRACEMA era talvez um gênio superior, a virgem privilegiada que Tupã destinara para proteger com a candidez de sua existência imaculada e descuidosa os valentes filhos dos Tabajaras.

Poema estremecido de imagens belíssimas iluminado pelas fulgurações dos astros que matizam o céu azul que se estende sobre a Pátria do grande escritor.
Apresenta-nos a visão lendária no grácil abandono de repouso à sesta, nos claros da floresta, ou mais tarde errando desolada pelos ermos sertões, a repetir o nome de Moreno à variação cariciosa, na hora contemplativa da saudade, ao morrer do dia.

Imortalizada pelo gênio de Alencar, o mimoso perfil dessa lenda selvagem, vencido pelo guerreiro branco, reflete-se através dos tempos sobre as alvas praias e as risonhas dunas que orlam os "verdes mares" marcando uma nova fase à literatura indígena e mostrando em colorido vivo, brilhante, a sensibilidade, a delicadeza e os afetos de uma alma feminina expandindo-se ao calor das silvas, grande na sua dedicação, sublime no generoso desprendimento com que esquece tudo e carpe como a ave solitária às margens pungentes da ventura perdida.

F. CLOTILDE. Ceará Intelectual. Fortaleza, 1910.

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